CICLO DO OURO

Tiradentes, Joaquim Silvério dos Reis, Chico Rei, Aleijadinho, entre outras tantas figuras, são personagens de um momento único da história do Brasil, o Ciclo do Ouro —oficialmente datado entre 1660 e 1789. O ciclo começa com a exploração de Fernão Dias, que o descobre na região de Ouro Preto. Hoje em dia, o circuito pode ser conhecido em cerca de 20 cidades de Minas Gerais (veja mapa).

A capital desse período foi Ouro Preto. Em 1750, a então Vila Rica tinha cerca de 200 mil habitantes (70% da população era escrava) —três vezes mais do que hoje. Pessoas de toda parte chegavam em busca do "ouro preto" —nome dado ao ouro de aluvião, encontrado na superfície dos rios e de cor escura, por ficar misturado aos restos de cascalho.

Manuel Bandeira, em seu "Guia de Ouro Preto", afirma que a cidade que não sofreu muitas transformações ao longo da história. Segundo o poeta, "não se pode dizer de Ouro Preto que seja uma cidade morta. Ouro Preto é a cidade que não mudou, e nisso reside seu incomparável encanto".

 
 

Bandeira dá, ainda, a dica ao turista: "Comece a conhecer a cidade por essa praça [Tiradentes, do século 17], a mais animada de Ouro Preto". Nela está o Museu de Minerologia, onde funcionava o Palácio dos Governadores. O museu reúne mais de 23 mil pedras de todo o mundo, espelhando um pouco da relação da cidade com a exploração dos minerais.

As igrejas de Ouro Preto também guardam sua porção de preciosidades. A de São Francisco de Assis foi projetada por Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, e é o ponto máximo do trabalho do artista. Filho de um português com uma escrava, Aleijadinho é o principal representante do barroco brasileiro. Suas obras podem ser vistas por toda a região do ouro: estão em Sabará, Nova Lima, São João Del Rei, Tiradentes, Mariana, Catas Altas, Barão de Cocais, Caeté e Congonhas.

A matriz Nossa Senhora da Conceição foi construída pelo pai de Aleijadinho, Manuel Francisco Lisboa. Como era costume na época, pai e filho estão enterrados no local. Lá também está o museu em homenagem ao artista, com obras e móveis que pertenceram a ele.

O poder da Igreja Católica povoou a região de templos religiosos. Ao lado das igrejas dos brancos, surgiram também as igrejas dos escravos, que rendiam homenagens aos santos negros, principalmente santa Ifigênia e são Benedito. Nelas, as roupas dos santos são bons exemplos da influência da cultura dos escravos. As imagens de são Pedro, por exemplo, têm a barra da calça virada e, algumas vezes, Nossa Senhora aparece com botina.

Um dos mitos da época do ouro —que pode ser conhecido de perto em Ouro Preto— é a Mina do Chico Rei. Dizem as histórias que o escravo Galanga foi rei do Congo e chegou ao Brasil batizado de Francisco (Chico). Acumulou dinheiro mineirando por conta própria e comprou sua alforria e a de seu filho. Depois de livre, comprou a mina da Encardideira —uma área de 80 m2 que ainda pode ser visitada— e, com o ouro, libertou outros escravos.

Ormuzd Alves/Folha Imagem
Casario colonial em Ouro Preto (MG)

Mas as outras cidades do circuito do ouro também têm o que contar.Em Sabará, há duas importantes igrejas com traços orientais, influência da cultura portuguesa da época. "A igreja Nossa Senhora do Ó parece um navio, com pintura vermelha e dourada, tipicamente chinesa", explica Maria Izabel Branco Ribeiro, do Museu de Arte Brasileira da Faap. Na matriz Nossa Senhora da Conceição, os motivos da cultura asiática estão nas porlaterais da capela-mor.

De Sabará também parte uma rota de peregrinação de 28 km que leva o viajante até a Serra da Piedade. O percurso só pode ser feito a pé e passa por trechos da estrada real, ruínas e arraiais antigos. Em Congonhas, no santuário de Bom Jesus de Matosinhos, estão os 12 profetas esculpidos por Aleijadinho em pedra-sabão. A obra é tombada pela Unesco como Patrimônio Cultural da Humanidade.

O poeta Carlos Drummond de Andrade também escreveu sobre a região e é hoje um dos maiores responsáveis pela atração turística de Itabira, sua terra natal. Lá está o primeiro circuito poético de Minas, os Caminhos Drummondianos —roteiro com 44 placas espalhadas pela cidade, com trechos de poemas.

A região da Serra do Caraça, que abrange os municípios de Barão de Cocais, Catas Altas e Santa Bárbara, tem forte legado religioso. O santuário do Caraça foi fundado por irmão Lourenço, que, ao morrer, teria deixado um testamento para que o local onde ele havia erguido a igreja Nossa Senhora Mãe dos Homens se tornasse um seminário.



O colégio do Caraça foi fundado em 1820 e funcionou até 1968, quando um incêndio destruiu parte de sua estrutura. O prédio foi reconstruído, mas o colégio não existe mais. Na igreja do colégio, há uma imagem da Santa Ceia pintada por mestre Athayde, contemporâneo de Aleijadinho, onde os inconfidentes são retratados como os apóstolos, com Joaquim Silvério no lugar de Judas, o traidor.

E não se pode esquecer de Mariana, considerada a primeira cidade temática dos séculos 17 e 18 em Minas. Na catedral da Sé está o mais importante museu de arte sacra do Brasil. Seu órgão, do século 17, ainda é utilizado. Turistas podem passear pelas ruas da cidade em carruagens e participar de encenações do passado, que acontecem uma vez por mês.